Entrevista com Gustavo Cerbasi
Famoso consultor
financeiro, Gustavo Cerbasi dá dicas valiosas e ainda conta que sua
participação (indireta) no cinema brasileiro continuará - depois do
sucesso de “Até que a sorte nos separe” (Globo Filmes), os produtores estão
trabalhando em uma continuação. Confira a entrevista recheada de boa informação
que preparamos para vocês!
Gustavo Cerbasi: Guardar dinheiro requer disciplina, que por sua
vez é fruto de motivação. Se a pessoa não tem um motivo muito significativo
para guardar dinheiro, qualquer propaganda já é motivo para quebrar a
disciplina. O grande problema é que, para poupar, as pessoas abrem mão de
qualidade de vida. Na preguiça de fazer um ajuste mais significativo no estilo
de vida, acabam cortando os gastos mais fáceis de serem eliminados, que
normalmente tem a ver com lazer, pequenos presentes e indulgências. O ato de
poupar é visto como punição, e por isso existe todo um processo subconsciente
tendendo a sabotar nossos planos. Por exemplo, quem facilmente cede a uma
tentação de compra em uma vitrine é porque está vendo na compra uma recompensa
muito maior e mais imediata do que na poupança. A vida está ruim e vai ficar
melhor após a compra. Se estivesse poupando para realizar um dos grandes sonhos
de sua vida, certamente pensaria duas ou três vezes antes de ceder a uma
tentação.
Como mudar a cultura do brasileiro no que tange ao
planejamento financeiro? E a cultura de investimento?
Gustavo Cerbasi: Em primeiro lugar, precisamos conscientizar as
pessoas de que não é cortando o cafezinho e a manicure que devemos fazer
poupança. As pequenas recompensas do dia a dia nos dão estabilidade emocional,
e por isso devem estar no topo de nossas prioridades de consumo. A poupança
será viabilizada quando aquele que pode comprar uma casa de R$ 100 mil perceber
que viverá melhor comprando outra de R$ 80 mil, pois terá sobras tanto para
poupar quanto para consumir qualidade de vida. Devemos deixar de lado a
condenação do supérfluo (já que tudo que consumimos para nos sentir bem não
pode ser chamado de supérfluo) e convidar o brasileiro a rever o padrão de suas
grandes escolhas – principalmente carro, casa, escola e moda. Quanto aos
investimentos, o que nos falta é simplesmente a cultura desse tema. Como a
riqueza é desigual no Brasil, investir ainda é tido como um assunto para
poucos. Faltam exemplos a serem seguidos. É preciso compartilhar muito mais
histórias de sucesso de pessoas comuns, para que os mais jovens tenham boas
inspirações a seguir.
O ensino de educação financeira nas escolas seria essencial
para mudar a cultura brasileira no assunto?
Gustavo Cerbasi: Seria preciso mais do que isso. A educação
financeira já começou nas escolas privadas há alguns anos, e neste ano começou
também em escolas públicas. Mas, enquanto as crianças aprenderem na escola e
não perceberem seus pais praticando em casa, educação financeira será apenas
conhecimento geral. É preciso um estímulo maciço de mídia e das instituições
para que a população adulta mude seus hábitos, para que as crianças reforcem na
prática o aprendizado que já recebem nas escolas. É muito difícil estimular a
poupança quando todos a seu redor agradecem a Deus pelo limite do cheque
especial.
Você conquistou seu primeiro milhão pouco depois dos 30
anos, como conseguiu? O que considera que foi primordial para isso?
Gustavo Cerbasi: Foi uma combinação de informação com desconforto.
Eu lecionava em uma instituição de ensino de finanças, que me dava acesso ao
mundo dos investimentos, ao mesmo tempo em que me sentia mal por ter uma grade
de trabalho muito extensa e desgastante. Em algum momento, enfiei na cabeça que
não poderia trabalhar a vida toda com aquilo, e que o caminho para conseguir
isso seria poupando grande parte do que eu ganhava. Vieram os planos para
casamento e uma motivação a mais para juntar dinheiro. Algum tempo depois, os
resultados dessa motivação se transformaram em combustível para os
investimentos. Vendi nosso apartamento e fiz investimentos muito oportunos
durante a crise de 2002, quando o Lula foi eleito. Daí nasceu uma regra
importante: quanto mais insatisfeito você estiver com sua carreira, mais deve
poupar, já que os satisfeitos podem esperar muito mais tempo para se aposentar.
O que você recomenda para uma pessoa que nunca planejou seu
orçamento e não costuma poupar e quer fazê-lo? Quais são os primeiros passos?
Gustavo Cerbasi: Não queira inventar a roda, comece simples. Adotar
um software de controle vai ser como colocar uma pedra no sapato, alterando sua
rotina. Tente manter a rotina, adotando práticas simples como guardar todos os
comprovantes de compras em uma caixa de sapatos. Apenas as compras sem
comprovantes devem ser anotadas. No fim do mês, organize seus gastos em uma
lista, e repita esse processo a cada mês. A consciência de evolução e variedade
de gastos já nos desperta uma nova postura de consumo. Se você perceber que
gasta demais com restaurantes, por exemplo, tenderá a ser mais racional na
escolha do próximo prato. Se você adotar uma série de ferramentas de controle
que lhe tomam um tempo diário, perderá essa disciplina na primeira semana mais
complicada de trabalho e não mais retomará. Um passo por vez: primeiro
organizar e dar mais qualidade ao consumo, para depois começar a rever os
grandes gastos e reduzir o custo de vida, para só em um terceiro momento adotar
a disciplina de poupança.
E para aquelas pessoas que já poupam: elas devem continuar
com a poupança ou procurar outras fontes de rendimentos (outros tipos de
investimentos)?
Gustavo Cerbasi: Sugiro que apenas leiam sobre investimentos. Não
faltam informações no site de seu próprio banco, e já existem dezenas de livros
sobre investimentos nas livrarias, entre eles o meu ”Investimentos Inteligentes”. Conscientizar-se das oportunidades
naturalmente conduzirá o leitor a fazer escolhas melhores. O que falta hoje às
pessoas é o precioso tempo para parar e pensar. Pare. Pense. Esse tempo para
você irá se pagar muito bem em sua vida.
Você acompanha a evolução de casos de pessoas que aprendem
com seus ensinamentos? O que eles dizem?
Gustavo Cerbasi: Encerrei meu escritório de consultoria
individual/familiar há cinco anos, e por isso não tenho mais um acompanhamento
formal de meus casos. Mantenho relacionamento com alguns de meus ex-clientes,
mas em número insuficiente para caracterizar uma estatística. Obviamente,
acredito que se esses ex-clientes não estivessem bem sucedidos em suas
finanças, não teriam amizade comigo até hoje. Mas, diariamente recebo através
do rádio, e-mail e redes sociais dezenas de depoimentos de pessoas que afirmam
terem mudado completamente suas vidas após uma palestra ou leitura de livro
meu. Fico feliz com isso, mas não me considero o responsável pela mudança. As
pessoas mudam suas vidas para melhor em razão do conhecimento, e não de quem o
transmite.
Quais são os principais problemas que uma pessoa tem para
não conseguir poupar (gastar mais do que ganha, cheque especial, parcelamento
etc) e como contorná-los?
Gustavo Cerbasi:
Perdemos o controle quando estamos infelizes e frustrados, buscando no consumo
um sentido de realização que não conseguimos na vida. Para reduzir os impulsos
de consumo, precisamos de mais recompensas. É por isso que convido as famílias
a conversarem mais sobre dinheiro, e que iniciem frequentemente esse assunto
com a pergunta: “você está feliz?”. Não podemos esperar o futuro para alcançar
as recompensas da vida, pois esse futuro pode não acontecer. As recompensas
devem acontecer hoje, com ajustes no padrão de vida para que possamos garantir
verbas para realizar sonhos. Mesmo que seus sonhos sejam futuros, você estará
mais feliz poupando para garantir a faculdade de seu filho do que se não
conseguisse fazer isso. Rotular a poupança é fundamental. Não basta poupar.
Você poupa para quê? Qual sonho vai ser realizado? Faculdade do filho, aposentadoria
de R$ 10 mil por mês, festa de bodas de ouro, volta ao mundo? Esses itens devem
vir no topo de suas escolhas de consumo. Se tiver que morar em uma casa menor e
mais simples, será melhor poder sair dela no fim de semana e realizar sonhos do
que passar o fim de semana trancado e frustrado em uma casa maior, concorda?
Quais livros você já têm publicados?
Gustavo Cerbasi: Já são 12 títulos, com pouco mais de 1,5 milhão de
exemplares vendidos em seis países. Os mais importantes são “Casais Inteligentes Enriquecem Juntos”, com 1 milhão em vendas, “Investimentos Inteligentes”, com 125 mil e Dinheiro, “Os Segredos de Quem Tem”, com pouco mais de 100 mil. O mais
recente é o “Dez Bons Conselhos de Meu Pai que Me Ajudaram Muito a Prosperar”, onde tiro lições de várias
passagens de minha vida pessoal (que está sendo lançado esta semana no Brasil).
Como foi a experiência de ajudar em uma produção
cinematográfica (filma “Até que a sorte nos separe”, da Globo Filmes)? Você
acredita que assim consegue atingir mais gente?
Gustavo Cerbasi: Essa foi, certamente, a experiência mais rica de
minha carreira. Quando surgiu o convite eu não esperava muito, mas, aos poucos,
produtores e distribuidores foram apostando no projeto, que acabou se tornando no
maior sucesso do cinema brasileiro de 2012. Meu objetivo, que era o de levar
educação financeira a um público muito maior do que o de leitores, foi
atingido. O roteirista Paulo Cursino e o diretor Roberto Santucci são os
grandes responsáveis pela genialidade do filme. Contando com eles, meu trabalho
ficou relativamente fácil no projeto. Fizemos alguns brainstorms para gerar
ideias para o Cursino, e depois eu fiz alguns comentários sobre o roteiro para
dar mais credibilidade aos papéis do consultor financeiro e das instituições
financeiras. Também fiz um laboratório com o Kiko Mascarenhas, que fez o papel
do consultor financeiro. O Kiko acabou se dando bem, pois o laboratório foi uma
consultoria que prestei para ele. E o resultado do filme foi tão bom que já
estamos produzindo a continuação. Em breve, “Até que a sorte nos
separe 2”!
Qual seria sua consideração final para nossos leitores e
parceiros?
Gustavo Cerbasi: Enriquecer é uma questão de escolha. Vivo essa
ideia, e meu trabalho é levá-la ao maior número possível de pessoas. Enquanto
as portas estão abertas, peço licença e vou entrando. Há muito a ser feito pelo
nosso pobre país.
Entrevistado: Gustavo Cerbasi é consultor financeiro e autor de diversos livros, entre
eles “Casais inteligentes enriquecem juntos” (Editora
Gente), “Investimentos Inteligentes” (Ed. Thomas Nelson Brasil), “Dinheiro
– Os segredos de quem tem” (Ed. Gente), “Cartas a um Jovem Investidor” (Ed.
Campus e o mais recente Dez Bons Conselhos de Meu Pai que Me Ajudaram Muito a
Prosperar (Ed. Fontanar), lançado nesta semana.
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