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terça-feira, 10 de setembro de 2013

ENTREVISTA: Conheça as principais falhas das empresas ao traçar o seu plano estratégico. De que modo este pode favorecer a criatividade dos colaboradores e a inovação nas empresas. Quais as vantagens de se planejar.

Pense antes de agir
Empreendedores tendem a agir por intuição, com visão de curto prazo e sem idéia do todo, atacando problemas específicos

A aviação é o meio de transporte mais seguro. Além da manutenção preventiva, uma explicação para isso é o planejamento exigido. Nenhum avião sai do chão sem um plano de vôo aprovado. No mundo dos negócios, uma empresa viaja com muito menos riscos se adotar o planejamento estratégico. “O natural é aprender com o erro, isto é, fazer primeiro e pensar depois. É preciso inverter essa lógica, pensar primeiro e fazer depois”, diz Paula Laudares, instrutora de planejamento estratégico do Instituto de Desenvolvimento Gerencial (INDG), de Nova Lima (MG).

Desde que o Brasil começou a ter uma economia mais estável, há uma década, o planejamento estratégico passou a fazer parte do vocabulário das empresas. As micro e pequenas, no entanto, ainda estão distantes dessa realidade. “Há uma tendência de atacar direto o problema específico com uma visão fragmentada, sem olhar o todo, sem uma visão sistêmica”, diz Paula. Entre aquelas empresas que já incorporaram esse conceito a sua cultura, é comum a confusão entre meios e fins – a estratégia e o objetivo final – e falhas em relação ao monitoramento do ambiente enquanto o plano de ação está em andamento. O mercado e o processo de planejamento estratégico são dinâmicos, o que exige atenção e ajustes constantes, e o foco da empresa é necessariamente os resultados.
Para se chegar aos resultados esperados, é necessário alinhamento e comprometimento de toda a organização. Na base do planejamento estratégico estão envolvidos o nível executivo e o gerencial, responsáveis pela formulação das estratégias e seu desdobramento em projetos e planos de ação, que uma vez implementados abrangem o restante dos funcionários. A partir desse ponto inicia-se a gestão estratégica, que implica acompanhar a execução da estratégia, corrigir falhas e ajustá-la a mudanças do ambiente. Para saber mais sobre esse conceito e como implementá-lo, leia a seguir a entrevista de Paula Laudares, que nos últimos cinco anos orientou mais de 50 empresas dos mais variados segmentos na estruturação de processos de planejamento estratégico.

RE – O que é um processo estruturado de Planejamento Estratégico?

Paula Laudares – É muito comum as empresas fazerem um pouco de confusão com três conceitos associados ao processo de planejamento estratégico: o primeiro é o que se chama de Formulação Estratégica (FE). A Formulação Estratégica é um processo estruturado para definir a identidade organizacional: visão, missão e valores da organização, suas metas globais e as estratégias para atingi-las. Os três principais produtos de um processo de FE são: visão, metas globais e estratégias. A FE termina com a definição da estratégia, em um direcionamento mais macro para a organização.

No segundo, o Planejamento Estratégico, há um avanço: as metas globais e as estratégias são desdobradas, e chega-se ao final do processo com metas desdobradas e vários projetos e planos de ação prontos para serem implementados. O terceiro conceito é o que se chama de Gestão Estratégica (ciclo de planejamento, execução, acompanhamento e ação corretiva), que implica executar a estratégia por meio dos projetos e planos de ação e fazer o acompanhamento do resultado dessas estratégias em relação às metas definidas.

RE – Quais são as ferramentas de gestão para o desenvolvimento do planejamento estratégico de uma empresa?

Paula – Dentro da etapa do planejamento, existem várias ferramentas associadas às análises de ambientes interno e externo que as empresas podem usar, como pesquisa de mercado, análise da cadeia de valor (saber onde é gerado valor e quais são os fatores críticos de sucesso do setor onde a empresa atua), etc. São várias ferramentas; dependendo da questão estratégica que a empresa está vivendo, foca-se mais o ambiente externo ou o ambiente interno, utilizam-se ferramentas mais simples ou mais complexas.

No Instituto de Desenvolvimento Gerencial (INDG), trabalha-se com três níveis de formulação estratégica: faixa branca, faixa marrom e faixa preta. Para as empresas faixa branca, não são usadas ferramentas muito complexas. Trabalha-se com brainstorming, diagrama de afinidades, trabalha-se muito com o conhecimento da empresa sobre o próprio setor, e o INDG atua mais como um catalisador, um facilitador, um mediador do processo. Quando se lida com empresas faixa marrom e faixa preta, são introduzidas ferramentas mais apuradas, como pesquisa de mercado e análise de valor, e aí o Instituto passa a criar informação para as empresas. Esse é o desafio.

RE – Qual é o papel de diretores e gerentes da empresa e dos consultores no processo do planejamento estratégico? Toda a empresa deve participar da elaboração do plano?

Paula – Depende muito das características da empresa. O processo conduzido pelo INDG tem caráter mais participativo. Tendemos a envolver, além da direção da empresa (presidente e sua diretoria), o nível gerencial, principalmente na fase de análise. Na fase de planejamento é importante envolver o nível da diretoria executiva e gerencial. Já na implementação, quando se fala de gestão estratégica – o que significa fazer as coisas acontecerem –, é preciso desdobrar as metas globais em metas específicas e as estratégias em projetos e planos de ação, e então o número de envolvidos começa a aumentar.
RE – Como fazer para envolver toda a empresa na implementação dos projetos estratégicos?

Paula – A primeira questão é a capacidade de liderança da alta administração. É essencial uma liderança forte, ou seja, que a direção demonstre que o planejamento é importante, na própria definição da visão, dando um norte, dando um rumo, e depois definindo metas globais alinhadas com aquela visão e, sobretudo, comunicando isso, porque o próprio processo de gestão estratégica é um processo de comunicação da estratégia. Para facilitar a comunicação da estratégia é construído o mapa estratégico. Esse mapa apresenta a visão, as metas globais, o desdobramento dessas metas e os projetos necessários para executar a estratégia.

É preciso ter liderança forte, desde o início do processo, para que haja participação de todos na implementação de fato das estratégias, porque senão não teremos nada além de um direcionamento, de um desejo, nada de resultados de fato. Com liderança forte isso vem; é como se fosse um encadeamento de metas e projetos estratégicos dos mais amplos aos mais específicos de cada unidade de negócio ou área.

RE – Quais são as principais falhas das empresas ao traçar o plano estratégico?

Paula – Uma que é muito comum é a confusão entre meios e fins. Em muitas empresas é dada muita ênfase aos meios, até porque estratégia é um meio, uma ação para se atingir determinados resultados. Há muita preocupação sobre o que fazer e como fazer, e menos em por que fazer isso, aonde se quer chegar de fato, quais são os resultados que se quer obter. É preciso inverter essa lógica, começar do “aonde queremos chegar?” e “que resultados queremos obter?” para depois definir qual a melhor estratégia para levar a empresa aonde ela quer chegar. Por mais simples que isso pareça, várias empresas trabalham com foco apenas na estratégia, e menos na quantificação, no resultado esperado. Os empreendedores são muito guiados por intuição, pela visão de uma pessoa, às vezes algum visionário que enxergou uma oportunidade, mas sem a preocupação de descobrir qual o potencial de resultado. Isso é um risco.

O INDG trabalha com o conceito de opções estratégicas para minimizar esse risco. Logo no início do processo o executivo precisa responder quais são as questões estratégicas para a empresa, ou seja, quais são as grandes preocupações quanto ao futuro da organização. Muitas vezes ele já tem a resposta, mas é importante explorar várias alternativas, buscar todas as possibilidades, que são as opções estratégicas, e avaliar qual é o melhor caminho. Quando a empresa segue essa linha, de pensar muito no que fazer e pouco no resultado, o conceito de opções estratégicas é a melhor forma de trabalho.

Já as empresas que conseguem desdobrar a estratégia, implementá-la de fato, passam a acompanhar os planos de ação, os projetos, mas pecam em relação ao monitoramento do ambiente. Será que aquela estratégia de globalização, por exemplo, ainda faz sentido, em função das mudanças de ambiente, nos mercados interno e externo? O questionamento se a estratégia continua válida não deve ser feito uma vez por ano, duas vezes por ano, mas sempre. Essa é uma falha na gestão estratégica de várias empresas.

RE – Quais são os principais desafios de um processo de planejamento estratégico?

Paula – Com a estabilidade econômica, começou a fazer sentido planejar. Hoje, o planejamento já começa a fazer parte da cultura das empresas. Ainda há muito espaço para evolução, mas as empresas já perceberam a importância do processo de um planejamento estruturado. No entanto, como é um processo que dá resultado no médio e longo prazo, muitas vezes as empresas têm uma tendência de atacar direto o problema específico com uma visão fragmentada, sem olhar o todo, sem uma visão sistêmica. Uma das maiores dificuldades é essa visão imediatista que ainda existe no ambiente empresarial.

RE – Essa é uma característica de todas as empresas, independentemente de porte?

Paula – As micro e pequenas empresas estão bem mais distantes. Como voluntária do Instituto Empreender Endeavor tive a chance de fazer um trabalho com uma pequena empresa bem-sucedida, formada por pessoas jovens, que trazem consigo um espírito empreendedor forte, e um pouco de resistência a processos muito estruturados. Elas têm a tendência de realmente aprender fazendo, o que nós chamamos de estratégia artesanal. Mas quando elas vivenciam um processo de planejamento estruturado, elas percebem o valor agregado e tendem a aderir. Mas não é natural; o natural é aprender com o erro, aprender, fazer, errar, voltar e corrigir, isto é, fazer primeiro e pensar depois. É preciso inverter essa lógica, pensar primeiro e fazer depois, e as micro e pequenas empresas têm muito a percorrer nessa direção, considerando que um erro pode ser fatal para esse porte de empresa.

RE – Cada empresa tem uma cultura diferente, conforme a sua origem (familiar, pública, empreendedora, etc.) e o mercado onde atua, entre outras características. O processo de planejamento estratégico é o mesmo para todas as empresas, ou existem nuances conforme o setor, porte e cultura? Quais são as principais diferenças?

Paula – O processo em si tem etapas que não se alteram. O diagnóstico preliminar pode ser mais financeiro, no caso do setor privado, e mais voltado para questões como atendimento e qualidade do serviço no setor público. A análise aprofundada de ambiente interno e externo é sempre uma segunda etapa. E depois o seminário para a definição de metas e estratégias e o desdobramento dessas em projetos. Por fim, o monitoramento dos resultados e do ambiente. Esse modelo é referência, é aplicável a todos os setores.

O que muda é a forma de implementar, não só da área privada para a área pública, como dentro da área privada em função das características da empresa, se ela tem uma forte cultura empreendedora, se é familiar, se tem uma cultura conservadora, ou se é uma empresa totalmente profissionalizada. É preciso saber quem envolver, quando envolver e como envolver. Um presidente com perfil extremamente empreendedor não pode ficar de fora do processo, tem que participar de todas as reuniões, por exemplo.

RE – De que modo o planejamento pode favorecer a criatividade dos colaboradores e a inovação nas empresas?

Paula – A abordagem da inovação dentro do processo de planejamento estratégico é algo novo no Brasil e tem sido provocado pela necessidade de inovação das próprias empresas. É diferente do processo de gestão da inovação, que é constante em empresas que têm a inovação como base, como diferencial. O que se tem buscado recentemente, durante o processo de planejamento estratégico, é buscar identificar oportunidades que promovam a inovação de negócios, e não a inovação de produtos e serviços. O que o INDG tem procurado fazer nesse sentido é promover o benchmarking externo, em empresas não relacionadas, não concorrentes. Identificam-se Fatores Críticos de Sucesso (FCS) para aquela empresa e procuram-se melhores práticas desenvolvidas por empresas de outros setores asssociadas a esses FCSs. A troca de experiências promove a criação de idéias e a adaptação de melhores práticas entre setores, com foco em resultados. Entendemos inovação como uma nova idéia aplicada com geração de resultados.

RE– Quais são as principais vantagens do planejamento estratégico?

Paula – Alinhamento da organização em torno de objetivos comuns, o comprometimento com a implementação, obtido por meio de um processo participativo, envolvendo as pessoas da empresa - usando o potencial delas e o foco em resultado, ou seja, o trabalho ancorado em metas, ou seja, nos resultados esperados.

Fonte: Revista Empreendedor
Por Alexsandro Vanin

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